sábado, 28 de julho de 2012


Porcino revela detalhes de como negociou com os sequestradores de seu filho. 
O empresário Porcino Júnior viveu, provavelmente, o período mais intenso de sua vida, marcado pelo sofrimento do sequestro do seu filho Porcino Segundo, o “Popó”, de 19 anos. Foram 37 dias intermináveis, de tensão, dor e incertezas, mas que também deixaram lições. O fim do sequestro mais longo da história do Rio Grande do Norte, faz Porcino refletir sobre a vida: “A partir de agora tudo será diferente. Vou tudo que não fazia. Popó nasceu de novo; eu também”, afirma o empresário nessa entrevista exclusiva gravada para o “Cafezinho com César Santos”. Na sala de seu apartamento em Natal, Porcino Júnior falou tudo sobre o sequestro, detalhando fatos até aqui desconhecidos de todos. Ele diz como Popó foi sequestrado, o sofrimento no cativeiro, a negociação com os sequestradores, a pressão psicológica, os momentos tensos e a felicidade de ter o filho de volta. Leia:

Como o sr. foi informado do sequestro do seu filho?

Eu estava em Veneza (nordeste da Itália) quando recebi a ligação da minha família. Foi um desespero. Viajei imediatamente de volta para o Brasil. Cheguei em 24 horas. Daquele dia para cá fiquei aqui em Natal e decidi que só retornaria para Mossoró com o meu filho Popó. Fiz esse pacto com Deus. Minha mulher (Rosane Caminha) ajudou muito, meu irmão Fábio foi meu companheiro, esteve ao meu lado o tempo todo, não saiu de perto de mim um só instante. Entregamos a nossas empresas a Deus, esquecemos esse lado, porque a única coisa que interessava era a volta de Popó. Eu dizia todo dia: tanto faz ter ou não empresa, eu quero é meu filho de volta.

Quando e como foi o primeiro contato dos sequestrados?

Eles me ligaram catorze ou quinze dias depois de levarem Popó. Foi um verdadeiro massacre, porque passamos duas semanas sem saber de nada. Antes disso houve muito trote, muita gente se aproveitou da situação para tentar obter alguma coisa. Devo reconhecer a postura correta da imprensa, dos jornais, dos blogs que trabalharam com responsabilidade, que nos ajudaram muito. A imprensa foi sensacional. Então, no primeiro contato eu pedi para falar com meu filho e eles não deixaram. Eu disse que só negociava alguma coisa se falasse com Popó, para ter a certeza que ele estava vivo, mas eles não me atenderam. Foi um sofrimento muito grande, um verdadeiro massacre a mim, a minha família e aos nossos amigos.

A partir daí, como foi que o sr. passou a agir? Recebeu orientação da polícia?

Tomei a decisão que não iria colocar a polícia no meio, porque eles ameaçaram matar Popó se eu acionasse a polícia. Chamei a minha família, comuniquei a decisão e disse: agora seja o que Deus quiser. A partir daí enfrentamos uma pressão psicológica muito grande. Os sequestradores ameaçaram muito; eles diziam que iriam castigar Popó, arrancar orelha, dedo, mandar os pedaços para a família. Nós resistimos, com muita força e fé em Deus, mas não foi fácil.

Nos 37 dias de sequestro o sr. conversou muito com os sequestradores? Como era feito esse contato?

Por incrível que pareça eles só fizeram cinco contatos. E na última vez foi que disseram quanto queriam para libertar Popó.

Eles pediram quanto?

Eles começaram pedindo 2 milhões de reais. Eu disse que não tinha esse dinheiro. Eles pressionaram, mas continuei dizendo que não tinha, não tinha, não tinha. Daí, eles começaram a baixar o pedido para 800 mil, 700 mil, 300 mil, e por último aceitavam receber até 170 mil reais. Essa negociação se estendeu não foi tanto pelo dinheiro, mas sim porque eu queria ter a certeza que Popó estava vivo e eles não me davam qualquer prova para eu me acalmar. Eu dizia que só negociaria com a certeza que meu filho estava vivo e eles se negavam a fazer o que eu pedia. A prova não vinha. Eu dizia para eles: eu não quero saber quanto é que vocês querem, eu quero saber do meu filho. Diga pelo amor de Deus onde está o meu filho, mas eles não me atendiam. Falavam apenas que Popó estava bem, e diziam que se eu não atendesse o pedido deles, mandariam um pedaço da orelha ou do dedo do meu filho.




Enpresário Porcino Júnior contou todos detalhes no “Cafezinho com César Santos” (foto: Joana Lima)

Eles exigiam o que mais?

Que a polícia não fosse chamada. Eu dizia: a polícia não está envolvida; só estamos eu e Deus aqui, mas eles não acreditavam. Eu dizia para eles que a nossa família estava arrasada; que a minha mãe estava hospitalizada, e que não iríamos colocar a vida de Popó em risco chamando a polícia. Daí, eles passaram a se concentrar apenas no dinheiro, mas eu não aceitei pagar qualquer valor de resgate porque não havia provas de que Popó estava vivo. Eu cheguei a propor a eles o seguinte: se vocês responderem a pergunta que eu vou fazer agora, eu aceito negociar. Perguntei para onde eu havia levado Popó recentemente, que só eu e Popó sabíamos, mas eles não responderam. O pior é que nesse dia, antes de desligar, os sequestradores disseram que só me ligariam de novo depois de 60 dias e que iriam multiplicar o valor pedido. Nos aguardem, diziam eles. Aí eu me acabava.

O sr. pensou em pagar o resgate?

César Santos, para ser sincero, eu tinha fé que Popó ia fugir do cativeiro. Eu acreditei nisso, porque Popó é muito simples, muito humilde e carismático, e que certamente iria ganhar a confiança dos sequestradores. Eu aprendi nesse tempo todo que existe a síndrome de Estocolmo, onde nos sequestros as vítimas podem se aproximar dos sequestradores. Meu psicólogo me dizia: “Popó já está estocolmizado”. Eles fizeram amizade e foi exatamente isso que aconteceu. Popó ganhou a confiança deles porque não deu trabalho. Numa das ligações, um sequestrador confirmou, ao dizer que estava me ligando porque Popó havia pedido. Disse que Popó era um menino muito bom, que as pessoas nas redes sociais (eles acompanhavam tudo pela internet) estavam torcendo por ele, porque era um menino muito querido e que não merecia sofrer. Daí, tive a esperança que tudo ia acabar bem.

A última ligação dos sequestradores foi feita quando?

Ontem (terça-feira), às 9 horas e 39 minutos da manhã. Eu estava fazendo os exames. Quem atendeu foi o meu psicólogo. O cara (sequestrador negociador) foi pesado. Disse: “Vocês tão é brincando, né? Agora avise aí a Júnior que só vou ligar daqui a 60 dias. Vocês estão brincando comigo, eu sei que ele está aí ao seu lado”. Fiquei arrasado. A minha sorte foi o meu psicólogo, que me acalmava dizendo que eu não me preocupasse porque esse é o modus operandi dos sequestradores. Mas eu pedi para falar com os sequetradores e com meia hora depois veio a nova ligação. Eles estavam apressados, queriam resolver naquela hora, acho que estavam prevendo a ação da polícia, como de fato ocorreu. Fizeram novas propostas, baixaram o valor pedido, foi mais pressão, mas eu não cedi. Eu tinha a convicção de que as coisas seriam resolvidas sem precisar pagar resgate.

Essa orientação de não pagar o resgate foi da polícia?

Não. Ficamos afastados da polícia desde o primeiro momento. A polícia fez um excelente trabalho longe da gente, em silêncio, de forma eficiente, tanto que resolveu o sequestro com muito sucesso. Nesses 37 dias, pode acreditar, eu estava num “cativeiro” sem saber de nada. Popó preso lá e eu preso aqui. Não tinha contato com a polícia. E o pouco que eu sabia não dizia a ninguém, nem para minha família, nem para os amigos, porque poderia atrapalhar. O nosso silêncio acabou criando uma rede de mentiras. Disseram que eu estava no shopping com meu filho, que eu estava viajando para os Estados Unidos, que eu havia pago 10 milhões de reais para os sequestradores e muitas outras coisas. Isso foi muito ruim. Cada mentira dessa, os sequestradores descontavam em Popó. Eles acompanhava tudo pela internet.



Qual o momento mais tenso?

Foi na penúltima ligação. O negociador (sequestrador) disse: “Você esqueça do seu filho”. A pressão foi grande demais. Naquele momento achei que tudo ia acabar. Como eu não cedi ao pedido de resgate e o tempo estava passando, eles estavam dispostos a tudo. Esse foi o momento mais difícil. Outro momento crítico foi quando eu pensei o que poderia acontecer com Popó se ele tentasse fugir ou no momento que a polícia iria estourar o cativeiro. Eu pedi a Deus que não deixasse acontecer nada de ruim com Popó e graças a Deus fui atendido. Agora estamos aqui vivos, com saúde e dispostos a viver muito.

E o momento mais marcante?

Teve dois momentos que me marcaram para o resto da vida. O primeiro, quando eles colocaram Popó para falar ao telefone. Foi na quarta ligação. Eles mandaram Popó ligar para mãe (Monalisa Sales) e depois para falar comigo. Quando ouvi a voz de Popó pensei que ele tivesse conseguido fugir, que era o meu sonho. Mas Popó disse: “papai diga quanto o senhor tem em dinheiro, venda as minhas coisas e pague logo esse resgate porque eles vão me matar.” Dai, começou a chorar; ele estava com medo. E pedi para ele ter calma que tudo terminaria bem. Ai o bandidoo tomou o telefone e disse: tá vendo aí, seu filho está sofrendo, você vai matar seu filho mesmo. Você só vai acreditar quando eu mandar os pedaços dele. Em seguida, passou o telefone outra vez para Popó, que me disse “pai resolva logo isso, não aguento mais sofrer. Faça o que senhor puder. Faça logo.” Esse momento me marcou muito. O outro foi quando a delegada Sheyla me ligou e disse que estava trazendo meu filho de volta para casa, vivo e sem nenhum arranhão. Ele chegou aqui ainda acorrentado, mas feliz porque estava voltando para os nossos braços.

Esse tempo todo a espera de ligação, como o sr. ocupava o tempo?

Eu li muito sobre sequestro. Através da internet, de livros, de reportagens, procurei saber detalhes desse mundo cruel. Eu tinha que conhecer um pouco de como enfrentar o problema. Me preparei para conversar com os sequestradores, para enfrentar a situação. Busquei todas as informações possíveis. Chegou o momento em que eu treinei para conversar com os sequestradores, para que fosse possível sequenciar o diálogo sem que prejudicasse a vida do meu filho. Esse foi um ensinamento forçado, mas que eu tive que aprender.

Como o sr. viu a ação da Segurança Pública do Rio Grande do Norte no caso?

Foi sensacional. A população deve valorizar mais as nossas polícias. A ação deles salvou a vida do meu filho. Popó mesmo me disse que nunca havia visto, nem em cinema, uma ação tão espetacular e profissional como a realizada pela polícia na hora que estourou o cativeiro. Popó contou que tinha terminado de almoçar, tava no quarto quando ouviu o pipoqueiro de granada, de bomba, de bala. Meu filho só fez sentar e rezar. Dai a pouco ouviu a pergunta: é você que é Popó? Sim, sou eu, ele respondeu. E a voz firme anunciou: sou a polícia, vamos, você está livre. Na mesma hora, a delegada Sheyla, que é uma pessoa humana, sensacional, competente, me ligou e disse que estava com meu filho. Considero ela agora a segunda mãe de Popó. Lembro que no início do sequestro eu disse para delegada que saísse do caso e nos deixasse só. Ele respondeu: “Se precisar de mim é só chamar.” E antes de sair me disse que era mãe e que iria trazer meu filho de volta vivo.

E agora, Porcino Júnior, como será a vida daqui pra frente?

Rapaz, a partir de agora a vida vai mudar muito.Vou começar a viver, fazer coisa que eu não fazia, porque me dedicava muito ao trabalho. (pausa, choro). Trabalhei muito na minha vida, mas agora vou fazer diferente, vou viver mais, ter uma nova vida. Popó nasceu de novo e eu nasci de novo. Vamos aproveitar mais e melhor as nossas vidas.

Para concluir, nesse momento o sr. conheceu os amigos de verdade?

Não tenha dúvida. Nunca pensei que existe tanta gente que gosta de mim, dos meus filhos, da minha família. Pessoas que oraram por Popó em Mossoró, no Rio Grande do Norte, no Brasil e fora do Brasil. Quero agradecer a todos. Reconhecer o empenho do Governo do Estado, da polícia do Rio Grande do Norte, da imprensa que foi sensacional. Quero agradecer a minha mãe, dona Noilde, que sofreu muito. A minha mulher, sempre ao meu lado. Aos funcionários que tocaram a nossa empresa com competência e zelo. E, principalmente, ao meu irmão Fábio. Ele esteve sempre ao meu lado, largou tudo para ficar comigo. Ficamos ainda mais unidos. Muito obrigado a todos.

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