Traficante NEM chefe do tráfico na rocinha é preso pelo Batalão de choque
Renata Leite (renata.leite@oglobo.com.br) e O Globo (granderio@oglobo.com.br)
RIO - O traficante Antônio Bonfim Lopes, o Nem, chefe do tráfico de drogas na Rocinha, foi preso no fim da noite de quarta-feira por policiais do Batalhão de Choque da PM, na Lagoa, em frente à sede do Clube Piraquê. Segundo a polícia, ele foi encontrado no porta-malas de um Corolla preto, onde viajavam mais três homens, que também foram presos - um deles se apresentou como funcionário do consulado da República do Congo, o segundo se disse cônsul honorário desse país e o terceiro era advogado. O secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, disse nesta quinta-feira, em entrevista ao Bom Dia Rio, que é fundamental a prisão de grandes chefes do tráfico, assim como apreensões de armas e drogas:
- A estratégia que está sendo utilizada é a quebra do império, é a quebra do muro imposto por armas, é a quebra daquele lugar, daquela ilha inexpugnável da violência. Na medida em que simplesmente se anunciou que isso ia acontecer, essas pessoas mostraram fragilidade - afirma Beltrame.
O secretário disse ainda que não há uma receita concreta de pacificação e não confirmou se a ocupação da favela da Rocinha começa no próximo domingo:
- A gente se prepara para entrar, sem confronto, mas não sabemos o que os criminosos têm na cabeça. Na Rocinha, há uma operação combinada que já começou há dias e nós ainda temos alguma informação a ser processada para determinar quando isso vai se dar - diz Beltrame
Comparsas de Nem ofereceram R$ 1 milhão a policiais para que o grupo fosse liberado
O carro em que Nem estava foi abordado inicialmente na saída da Rocinha por policiais do Batalhão de Choque, mas o suposto funcionário do consulado, alegando imunidade diplomática, se recusou a passar pela revista e a abrir o porta-malas. Ele afirmou que só abriria o veículo numa unidade da Polícia Federal. Os PMs seguiram então o carro em direção a uma unidade policial. Na altura do Piraquê, no entanto, o automóvel parou e um dos homens teria oferecido o suborno aos policiais para que fossem liberados. A Polícia Federal foi chamada porque o advogado invocou a imunidade diplomática do cônsul para não abrir a mala do carro. O Corolla foi revistado, e Nem, encontrado. O traficante foi levado para a sede da Polícia Federal, na Praça Mauá.
O soldado Heitor, do Batalhão de Choque da Polícia Militar, que participou da prisão, contou na manhã desta quinta-feira que o advogado que estava no carro ofereceu num primeiro momento R$ 20 mil de suborno para que o grupo fosse liberado. Diante da recusa dos policiais, eles aumentaram o valor para R$ 1 milhão.
Ele disse ainda que todos os carros estavam sendo revistados por ordem do comando da PM e que a hora avançada e a potência do Corolla usado pelo cônsul chamaram a atenção dos policiais.
- Me sinto orgulhoso com a vitória - disse o policial.
O cabo Eduardo Teixeira, do Batalhão de Choque, que também acompanhou a prisão na Lagoa, confirmou que o suposto funcionário do consulado ofereceu propina.
- Quando o porta-malas foi aberto, o Nem viu que tinha perdido e não apresentou nenhuma reação - disse Teixeira.
O comandante-geral da PM, coronel Erir Ribeiro da Costa Filho, foi à sede da Polícia Federal e disse que os traficantes da Rocinha, onde em breve será implantada uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), estão se sentindo acuados:
- Eles estão tentando fugir da favela. Continuaremos revistando todos no entorno da comunidade.
Em volta da sede da PF, os PMs comemoravam a prisão.
Nem era o alvo de policiais que faziam um cerco na favela, que deve receber uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) no próximo domingo. A Polícia Militar havia reforçado o patrulhamento nos acessos à Rocinha e à Favela do Vidigal, também na Zona Sul, inclusive com viaturas da corporação. Agentes do Batalhão de Operações Especiais (Bope) chegaram a ocupar a Vista Chinesa, uma das possíveis rotas de fuga de bandidos da Rocinha.
No início da noite, dez pessoas, entre policiais e traficantes, foram presas durante operação da Polícia Federal , quando cinco agentes civis e militares escoltavam cinco traficantes que estariam fugido da Favela da Rocinha. O grupo estava dividido em quatro carros que foram interceptados por agentes da PF em frente ao Shopping da Gávea e ao Jóquei, na Zona Sul do Rio. Um dos bandidos presos é o traficante Anderson Rosa Mendonça, conhecido como Coelho, braço-direito do traficante Nem e chefe do tráfico no Morro de São Carlos. Nos carros foram apreendidas armas, granadas e drogas. Todos foram levados para a sede da PF, na Praça da Bandeira. Os bandidos teriam negociado, segundo uma alta fonte da Polícia Civil, o pagamento de cerca de R$ 2 milhões pela escolta feita pelos agentes do estado. Com escutas telefônicas autorizadas pela Justiça, agentes federais estavam monitorando os traficantes e flagraram os policiais em conversas com os bandidos.
Entre os presos, segundo a PF, estão três policiais civis, sendo deles da Delegacia de Repressão a Roubos e Furtos de Cargas (DRFC) - Carlos Renato Rodrigues Tenório e Wagner de Souza Neves - e um da Delegacia de Repressão a Crimes contra a Saúde Pública (DRCCSP) - Carlos Daniel Ferreira Dias. O grupo também conta com dois ex-PMs, José Faustino Silva e Flávio Melo dos Santos, de acordo com nota enviada pela PF na noite desta quarta-feira. Os outros cinco são traficantes. Além de Coelho, outro dos principais chefes do tráfico no Morro de São Carlos, no Estácio, também estaria entre os presos na noite desta quarta-feira. Sandro Luiz de Paula Amorim, o Lindinho ou Peixe, foi procurar abrigo na Rocinha logo após seu reduto ser ocupado por uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Ele foi encarregado de assumir também o comandos das favelas de Macaé, após a morte do traficante Roupinol, ocorrida em 2010. Os outros três bandidos são Paulo Roberto Lima da Luz, conhecido como Paulinho; Varquia Garcia dos Santos, conhecido como "Carré"; e Sandro Oliveiro.
Três fuzis, dez pistolas, cinco granadas e 20 carregadores, além de reais e euros em quantidade ainda não revelada, foram apreendidos. Também foram apreendidas joias em ouro.
Segundo o Tribunal de Justiça, a PF pediu auxilio à Vara de Execuções Penais para monitorar um dos integrantes do grupo que foi preso. A PF sabia que ele, por ser foragido do sistema penal, estava usando uma tornozeleira eletrônica. Através desse monitoramento, foi possível localizar o grupo.
A correria dos policiais para capturar os bandidos transformou a rotina da Rua Arthur Araripe, uma via curta, predominantemente residencial, em frente ao shopping da Gávea, que liga a Marquês de São Vicente à Autoestrada Lagoa-Barra. Os policiais fecharam o trânsito em dois pontos durante a operação, que mobilizou cerca de 40 agentes. Algemados, os bandidos presos eram colocados deitados no asfalto.
Nem responde a 10 processos e 20 inquéritos
À frente de uma holding criminosa que fatura cerca de R$ 10 milhões por mês, vendendo no atacado e no varejo desde maconha até ecstasy, e apontado como responsável por uma série de espancamentos e assassinatos, Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem da Rocinha, responde a uma dezena de processos por tráfico e formação de quadrilha, além de 20 inquéritos, inclusive por lavagem de dinheiro.
Franzino e com orelhas de abano, Nem nunca se destacou pelo physique du rôle. O chefão do tráfico na Rocinha surgiu quase por acaso. Ele começou a trabalhar para o traficante Lulu depois que este lhe emprestou R$ 400 mil para pagar o tratamento de sua filha, portadora de uma doença óssea rara.
Com a morte de Lulu, Nem passou a ser o braço-direito do sucessor, Bem-Te-Vi, que rompeu com a facção criminosa que dominava o morro. Como Bem-Te-Vi se afundava no álcool, Nem ganhou espaço até substitui-lo quando ele foi morto pela polícia, em 2005.
- Nos seis anos em que domina a Rocinha, Nem, que não costuma se drogar, tornou o negócio da droga mais rentável e profissional. Ele procura evitar confrontos com a polícia porque não quer afungentar os compradores e, ao contrário de outras favelas, não vende crack porque é um tipo de droga que leva o viciado a roubar e a criar problemas. Mas de maconha aos sintéticos, oferece de tudo - conta a ex-deputada federal Marina Magessi, que, como inspetora de polícia, investigou a quadrilha do bandido.
A Rocinha é um hipermercado das drogas. A "firma" cresceu com Nem, inclusive com delivery para a Zona Sul e a Barra. Em 2007, a polícia descobriu lá o primeiro laboratório de refino de cocaína numa favela, capaz de produzir meia tonelada da droga para abastecer 13 morros. Nem pagava R$ 40 para cada pessoa que comprasse numa loja no Centro produtos de uso controlado utilizados na refinaria. Seguindo os compradores, os policiais descobriram que boa parte deles ia para a Rocinha.
Nem distribuía cestas básicas e se envolveu com política, a começar pela eleição para a associação de moradores, mas é temido por ser temperamental. Um dia antes da invasão do Intercontinental, teria mandado espancar um morador que tentou enganá-lo fazendo com que a mãe pedisse R$ 10 mil para livrá-lo de um suposto sequestro praticado por policiais. O bando dele é suspeito da morte da jovem Luana Rodrigues de Sousa, de 20 anos, desaparecida desde maio. Ela trabalharia como "mula" para Nem e teria vazado informações da quadrilha para um policial com quem namorava.
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